sexta-feira, 11 de junho de 2021
A Pseudo Direita, o Fenômeno da Vídeo Cultura e a Retórica
quarta-feira, 12 de maio de 2021
Barraco Literário: Otto Maria Carpeaux, Dalton Trevisan e os 500 Ensaios
Sessões de adulação mútua, panelinhas, ressentimentos, fetiches verbais... "Acuse-os do que você faz, chame-os do que você é". Lenin... ou terá sido Lennon?
“O que constrange no Sr. Carpeaux, portanto, dentro dos quinhentos e tantos ensaios que já publicou no Brasil, segundo dados de alguém versado em estatística e que queria, para nosso castigo com certeza, tomasse o governo brasileiro o encargo de republicá-los em volumes, é justamente não se perceber nada que possa constituir um testemunho de nossos estados de espírito particulares, no sentido do que possa haver de atual ou de efetivo em nossa cultura. ”
O fragmento crítico acima parece atual, muito similar às objeções que os BookTobers de hoje e de direita fazem aos escritores que não compartilham de sua mesma (tenhamos boa vontade) cosmovisão, os chamados “modernistas” ou “progressistas”. No entanto, 500 Ensaios é o título do artigo polêmico publicado no número 21, o derradeiro da revista Joaquim. O ano era 1948 e do artigo Otto Maria Carpeaux, queridinho desta facção conservadora (mais um pouco de boa vontade), não era o autor, mas a vítima.
O curioso dessa história é que Dalton Trevisan, o misterioso e bem sucedido escritor paranaense, por ser o fundador da revista Joaquim foi tomado como o autor das linhas contra Carpeaux e recebe deste um duro (contra)golpe em forma de Crítica Literária “isenta” e desafetada (crítica isenta que contrariou nada menos do que um Jabuti).
Uma década depois, quando tudo já parecia resolvido e superado, numa reviravolta digna das novelas mexicanas o verdadeiro pai dos “500 ensaios” se revela ao mundo intacto e com as mesmas opiniões sobre Carpeaux... tão diferentes e iguais das que lemos hoje em dia. Será mesmo que esta turma Tem Razão e como vivem repetindo - direita e esquerda são sinônimos de certo e errado, respectivamente? Ou estes pseudoconservadores daqui apenas sofrem da saudade do que nunca existiu? Afinal alguém já disse que os ditos "bons tempos" não passam de uma aliança entre péssima mémoria e fértil imaginacão.
Sem mais delongas, apreciemos a treta:
500 Ensaios – Revista Joaquim n° 21.
Quando o Sr. Otto Maria Carpeaux iniciou a sua carreira literária no Brasil – e já lá vão perto de dez anos -, houve entusiasmos de primeira hora que não tinham a escudá-los nenhuma justificação séria, como houve, depois de certo tempo, o reverso da medalha: um tratamento pouco simpático, às vezes agressivo, contra aquele que se contentaria em chegar a ser um dia, um bom camarada, um companheiro nosso, segundo o depoimento de Álvaro Lins, então empolgado com a sua descoberta.
Certamente que tudo isso mudou muito hoje, a despeito de continuar invariável a presença de Carpeaux em vários suplementos de jornais. Os suplementos o acolhem e lhe reservam lugar de destaque, por motivos de economia interna com que nada temos que ver.
Mas haverá, por acaso, alguém capaz de acreditar agora que o Sr. Otto Maria Carpeaux tenha sido inspirador de alguma nova corrente de vida em nossa literatura? De alguma corrente que tenha sido rica em ensinamentos, em diretivas morais e intelectuais?
Hoje, que muita água já correu sob a ponte, estão porventura confirmadas aquelas qualidades de profeta pessimista (um pessimismo que nada tinha de demissionário, mas antes de consciente, de trágico, de viril) que lhe exornavam o retrato tão favorecido com que de antemão nos brindara o seu panegirista exaltado de outrora?
A resposta negativa de há muito que já veio em torno do camarada tão pouco camarada, que continua mais estrangeiro no Brasil do que quando aqui aportou.
Sim, falando sempre por cima, com grande decepção para aqueles que quiseram lhe enxergar propósitos e sentimentos fraternais de união conosco, o Sr. Otto Maria Carpeaux tem demonstrado em nosso meio apenas uma preocupação: a de deixar erudição, de nos aturdir com a sua duvidosa sabedoria, sem ter até agora visado qualquer objetivo mais alto. Mais alto ou que tivesse em consideração pelo menos o que é inerente a todo escritor que se preza, interessado em captar o espírito, a palavra falada de uma geração ou de uma época. Pois não resta dúvida que um escritor deve sintetizar essa palavra, pondo-a em letra de forma. É o que se costuma chamar de seu caráter de historicidade. Todo escritor deve possui-lo, sob pena de se tornar inatual e padecer do mal irremediável que é o recuo ou o alheiamento no tempo e no espaço, sem nenhum apoio nos elementos profundos de um povo ou de uma geração. A função do escritor é bem a de recortar as palavras e as frases em uso para projetá-las adiante, etc. A historicidade é isso e um escritor que conta o que vê em seu desredor, sensível ao seu meio e ao seu tempo, é bem um arquiteto da história.
O que constrange no Sr. Carpeaux, portanto, dentro dos quinhentos e tantos ensaios que já publicou no Brasil, segundo dados de alguém versado em estatística e que queria, para nosso castigo com certeza, tomasse o governo brasileiro o encargo de republicá-los em volumes, é justamente não se perceber nada que possa constituir um testemunho de nossos estados de espírito particulares, no sentido do que possa haver de atual ou de efetivo em nossa cultura.
Poderão objetar que a crítica de Carpeaux não tem sido indiferente a muitos de nossos escritores. A um Álvaro Lins, a um Graciliano Ramos a um Carlos Drumond de Andrade, não é possível negar, ela tem feito referências. Mas quanta incompreensão, quanta especiosidade nessa crítica!
Se quisermos ser rigorosos, seremos forçados a admitir que nada de novo ela veio acrescentar ao que a crítica indígena já nos havia descoberto ou explicado, acerca dessas importantes figuras.
Poderão ainda falar na esquisita originalidade de visão que a crítica de Carpeaux apresenta, de permeio com a sua erudição impressionante e que a princípio não nos deixara indiferentes.
Tudo isso, porém, se volatilizou e esfumou no passado. A erudição indigesta que o Sr. Carpeaux continua nos impingindo, nos deixa agora de todo indiferentes. Se não fosse isso, como explicar a nossa paciência?
Um merecimento, de resto, ainda hoje cabe a Carpeaux e que lhe permite cultivar os seus ressentimentos, dar pasto às suas simulações de amizade, assumir com desenvoltura a sua ênfase professoral, etc. Queremos nos referir às suas habilidades de infiltração dentro do espírito de "coterie" existente no Rio de Janeiro.
Sob esse aspecto, é que sua figura ainda nos pode interessar. Pois Carpeaux se tornou hoje um dos maiores representantes desse mesmo espírito que ele pretende ver generalizado em todo o Brasil.
O seu sistema, graças à independência e ao desassombro de alguns moços, já está desmascarado. Esse papel de um novo Mario de Andrade junto dos novos não lhe será confiado, temos hoje certeza.
Falta-lhe muita coisa para isso. Falta-lhe principalmente sinceridade e honestidade.
Falta-lhe um ativo ponderável de participação benéfica e inteligente em nossa vida literária. Uma participação que pudesse, por exemplo, ser colocada no mesmo plano da de um Roger Bastide.
O que os moços veem em Carpeaux é um desprezo profundo por tudo quanto é nosso e se mantém incólume diante das dissolventes e incaracterísticas contaminações estrangeiras. Eis a razão porque ele não vislumbra nenhuma tendência no romance brasileiro digna de nota. Uma palestra sua a respeito e recentemente publicada em “O Jornal” é prova disso.
Antipático esse seu ar de regente, que ultimamente ele vem disfarçando com uns laivos de humour desenxabido. A sua erudição morta, que nada tem dos jardins povoados de plantas vivas, de que falava Saint-Beuve, cujas propriedades nos fossem ensinadas, passou agora a ser entremeada de tons irônicos, de pouco caso, que mais agravam a mesquinhez e a indigência da visão carpeautiana.
Quando ele se põe a corrigir e a distribuir justiça, não sabe então fazê-lo a não ser no estilo daquele horroroso artigo publicado no “Quixote”, tratando do erudito português, seu rival, Mendes dos Remédios, a seu ver, um caso específico de burrice portuguesa. Estilo intolerável, que mais parece ser uma tradução mal feita. Tradução, por sua vez, de uma língua estrangeira que Carpeaux é o primeiro a conhecer mal e cuja leitura tanto nos cansa.
Mas esse artigo do “Quixote” é uma definição completa. Nele Carpeaux não se limita apenas a Mendes dos Remédios. A sua erudição leviana aborda muitos assuntos. Ora mete a ridículo os nossos Silvio Romero e Ronald de Carvalho. Ora verbera Chostakowski, o autor da “História da Literatura Russa” há pouco traduzida para a nossa língua, classificando-o de “pobre diabo”. Ora é Van Tieghen que é acusado de não obedecer a ordem cronológica em seu compêndio de história da literatura universal, com apoio em exemplos díspares, que nada ferem o critério estabelecido. Ora ainda é um historiador da literatura espanhola que é imputado de omissão não cometida em relação à poetisa Rosália Castro, etc.
O que resulta, afinal de contas, é a inconsistência de pensamento e muitas vezes de informações em que se firmam as análises críticas de Carpeaux, cujo resultado não é outro senão o de nos lançar na confusão e na dúvida.
Se é que se pode falar em contribuição a respeito de Carpeaux, a sua tem sido antes dirigida no sentido de desnaturar a nossa crítica, emprestando-lhe recursos de uso proibido que a desvirtuam totalmente e, sobretudo, privando-a desse requisito que lhe é consubstancial, como aliás é da crítica em geral: o bom gosto.
Que mau gosto alarmante o de Carpeaux! Um mau gosto que nos faz lembrar o paradoxo de Stendhal, traduzindo às vezes uma verdade patente: o mau gosto leva ao crime.
No caso de Carpeaux, de sua erudição indigesta, irreal e às vezes falsa, por certo que esse perigo não existe. Que pode haver nele e nela de comum com os moços e as suas experiências?: Que pode haver nele e nela de comum com o Brasil?
A Resposta de Carpeaux.
Uma crítica nada desafetada ao desafeto errado
O VOLUME Novelas Nada Exemplares, do Sr. Dalton Trevisan, tem 214 páginas. É fácil calcular o tamanho médio das 30 histórias. Várias só têm 4 páginas; a mais comprida, 14 páginas. Não correspondem, portanto, ao conceito usual da “novela” como conto longo ou romance breve. Mas tamanho não é critério. Em face das confusões que os falsos mansfieldianos difundiram acerca da arte novelística de Tchecov, um conhecedor da matéria, o professor Johannes Klein, em sua Geschichte der Deutschen Novelle (Wiesbaden, 1954), esforça-se para caracterizar melhor os gêneros afins: a novela, pelo elemento da surpresa (que a aproxima do drama), e a short-story pela pointe (que a aproxima do drama). Chega mesmo a uma definição epigramática que cito sem querer assiná-la: “Uma novela é boa quando surpreende; uma história curta surpreende quando é boa”... Mas para que servem as discussões multisseculares e estéreis sobre gêneros e subgêneros? “Tous les genres sont bons, hors l'ennuyeux.” Etimologicamente, a novela é gênero que nos conta algo de novo, digno de ser contado. E que é que o Sr. Dalton Trevisan nos conta?
A matéria do Sr. Dalton Trevisan é a vida de gente primitiva: crianças, adolescentes, pequenos empregados, prostitutas, criminosos, idiotas, loucos. Exemplo: um menino adoece; os pais ficam desesperados; o menino morre; e é só. É o enredo de Pedrinho, que abre o volume. O acontecimento é triste, mas não é trágico, não é dramático, não surpreende, não é novela. Diriam que é uma trivialidade? Não seria censura, seria definição. A vida de gente primitiva costuma ser trivial. Por isso, o termo define perfeitamente as trinta histórias do volume.
Tudo é trivial naquelas vidas. Triviais são os horrores: descrições minuciosas de agonias, tentações, crimes (O Morto na Sala; Tio Galileu; O Convidado; Últimos Dias); nas 8 páginas de Aventuras de João Nicolau condensou o autor uma biografia inteira cheia de todos os crimes e abjeções possíveis, contada em estilo telegráfico como se fosse necrológio de um malfeitor na crônica de um vespertino. Triviais são as cenas escabrosas (No Beco; A Velha Querida), instantâneos de visitas em casa de prostituta principiante ou em bordéis. Quando o autor deixa sem explicação os motivos do comportamento dos seus personagens (O Noivo; O Domingo; Quanto de Hotel), consegue transformar em trivialidade o Absurdo. Em histórias como Gigi ou Meu Avô, o próprio assunto é a trivialidade tout court e mesmo muito curta.
Assim como W. H. Bruford (Tchecov and his Russia, Londres, 1947) desenhou um mapa da Rússia habitada pelos personagens do grande contista, assim seria instrutivo um mapa da Trevisanlândia: país habitado por loucos, idiotas, sádicos, prostitutas, meninos perversos, pederastas, cornos, assassinos, incestuosos, estupradores, presidiários, que moram em celas sujas, em pensões sujas, em becos sujos. Todas as 30 histórias são parecidíssimas, cada uma com cada qual outra. São como as caras de que dizia Wilde: “Uma vez vistas e nunca mais lembradas.” Seriam “nada exemplares”? Não. São exemplos perfeitos daquele gênero ennuyeux. Caracterizam-se pela ausência total de humor. No entanto, o autor pensou no maior dos humoristas ao escolher o título do seu volume, que evoca as Novelas Ejemplares de Cervantes, provavelmente o mais importante livro de novelas da literatura universal.
A pretensão inédita desse título parece desafio à crítica. No entanto, esta, insensível a provocações, não deixará de assinalar, logo mais, o lado positivo da novelística do Sr. Dalton Trevisan. De um livro totalmente inútil o melhor seria não falar. Sou contra o conceito que atribui à crítica a tarefa de policiar o mercado de livros. O protesto só se justifica quando a publicidade ameaça perturbar a hierarquia dos valores, iludindo o público e, sobretudo, os escritores principiantes, sempre em perigo de seguir maus exemplos muito elogiados.
Só acontece isso com livros publicados por grandes casas editoras que, nem sempre bem aconselhadas na escolha das suas publicações, empenham seu prestígio, com imparcialidade, a favor de obras boas e de obras menos boas. No caso de Novelas Nada Exemplares já se podia ler que não se trata de “obscenidades gratuitas”, mas de um corajoso ataque contra as convenções morais. Examinarei logo mais a natureza desse ataque. Mas se, talvez, leitores ingênuos caírem na cilada, esperando delícias escandalosas em letras de forma, sejam advertidos: o livro do Sr. Dalton Trevisan não é pornográfico. Numa história como No Beco, encontros de um adolescente com uma prostituta principiante, o autor chega a fazer uso abundante de cautelosas reticências. A mais audaciosa das suas frases — “... ergueu o vestido para que eu visse, e eu vi” — não é revelação, a não ser para um adolescente. Mas mesmo alguns leitores mais crescidos acharão flagrante bem observado.
É este o lado positivo da novelística do Sr. Dalton Trevisan: é observador atento dos pormenores da realidade. Sabe imitar a fala da gente primitiva. Talvez sua verdadeira vocação seja a de cronista do cotidiano; e o cotidiano nem sempre é muito limpo. Se não fossem aquelas reticências, o Sr. Dalton Trevisan poderia parecer naturalista.
Mas é o Sr. Trevisan naturalista? Tratando dos dois maiores contistas do naturalismo, Maupassant e Verga, críticos como Croce e Luigi Russo, como Renato Serra e Roland Barthes salientaram os motivos de piedade misericordiosa e de pavor pânico na descrição das existências primitivas e dos seus destinos catastróficos, o que — nem em Verga nem em Maupassant — exclui a serenidade superior do humorista. O Sr. Dalton Trevisan, que desconhece a atitude do humor, tampouco se apieda das suas criaturas. O motivo da sua atividade de novelista é outro: é a profunda aversão contra a vida que criou essas criaturas e contra a vida que levam.
Considerado assim, o livro do Sr. Dalton Trevisan pertence a uma grande tendência da literatura moderna: para defini-la bastam nomes como Sartre, Camilo José Cela e Moravia. É a literatura da nausée. Mas sente-se na leitura das Novelas Nada Exemplares que não foram escritas em Paris nem em Madri nem em Roma. A nausée do autor curitibano não é produzida pela vida sans phrase, mas apenas pela estreiteza da vida provinciana, que lhe parece maldição apocalíptica. Sabe descrever esses seus ambientes com segurança de um naturalista. Mas exagera tremendamente. Não se sente seguro dentro desse mundo porque, na realidade, não é seu mundo.
Esta falta de segurança revela-se nas vacilações do seu estilo. Às vezes, dispersa o enredo (Chuva); outras vezes, conta em poucas páginas uma movimentadíssima vida inteira (Aventuras de João Nicolau). As mais das vezes conta em estilo de telegrama ou de notícias de repórter; outras vezes, perde-se nos meandros de intermináveis frases pseudoproustianas (A Velha Querida). Não é principiante no gênero, mas parece principiante na vida, de menor idade emocional do que intelectual. Os muitos pormenores observados na realidade não se integram numa realidade artística, reflexo da outra. As histórias do Sr. Dalton Trevisan, contos de más fadas, parecem-se com Tagtraeumen, sonhos de acordado, excessos de imaginação desenfreada de um adolescente cheio de ódio contra sua realidade que é “luxe, calme et volupté” duma existência comodamente burguesa. Eis o motivo que inspira a esse jovem discípulo de Gide o grito de revolta contra a falta de sentido na vida. Mas muito naturalmente — ninguém renunciaria à sua vida para escrever contos — o autor só encontra essa falta de sentido na vida de outros, de criaturas inferiores, primitivas, insignificantes. Daí a extrema insignificância dos seus enredos. Como lema do volume poderiam servir os versos de Shakespeare:
“... (Life) is a tale
Told by an idiot, full of sound and fury,
Signifying nothing.”
O Sr. Dalton Trevisan responsabiliza a Vida pela falta de sentido das suas histórias. Mas — com licença para a observação — é ele, o autor, que as conta.
Não é esse o caso das novelas que o Sr. Dalton Trevisan evocou ao escolher o título do seu volume. No entanto, a comparação com o grande livro de Cervantes poderia servir para justificar a tentativa audaciosa do escritor paranaense. Conforme Joaquín Casalduero (Sentido y Forma de las Novelas Ejemplares, Buenos Aires, 1943, p. 40), os acontecimentos nas novelas de Cervantes criam nos personagens um estado de alma próprio “para el hombre salvarse”. Nas novelas nada exemplares do Sr. Dalton Trevisan, os acontecimentos criam nos personagens um estado de alma próprio para o homem perder-se. É uma inversão perfeitamente legítima, à condição de os acontecimentos prepararem, justificarem a surpresa da perdição (como, em Cervantes, a da salvação); isto é, à condição de tratar-se de novelas. Assim voltaremos às conclusões de Johannes Klein: “Uma novela é boa quando surpreende; uma short-story surpreende quando é boa.” Já se vê que as histórias curtas do Sr. Dalton Trevisan não surpreendem.
Texto Fonte: CARPEAUX, Otto Maria. Ensaios Reunidos 1942-1978, Volume I, De A Cinza do Purgatório até Livros na Mesa. Rio de Janeiro, UniverCidade Editora/Topbooks, 1999. (pgs. 897-900). Editado por: Pedro G. Segato WRITTEN BY
Carpeaux X Novelas Nada Exemplares, ganhou o Jabuti
Temístocles Linhares - A Revelação
Diário de um Crítico, apontamentos do dia 02 de Junho de 1959 p. 138.
Como esse homem é mesquinho! Confesso que não o imaginava assim tão pequeno e ridículo. A história é simples. Nos tempos da Joaquim, ele foi desmascarado por um artigo de redação da revista. Otto Maria Carpeaux vivia escrevendo cartinhas aos moços para lhes dar conselhos e fazer, sobretudo, cartaz à custa deles. A revista prestou um serviço à literatura brasileira acabando com essa mistificação. De resto, depois disso, Otto Maria Carpeaux ficou reduzido às suas exatas proporções. Não se tratava de nenhum sábio, nem de nenhum homem sério. O seu processo de desmistificação começou aí, nessa ocasião. O pior é que ele ficou atribuindo a autoria desse artigo a Dalton Trevisan que, no caso, estava como Pilatos no Credo. O artigo em questão fora redigido por mim. Embora um pouco maldoso, não me arrependo de tê-lo escrito. Era uma iniciativa de saneamento que alguém precisava tomar e que a revista tomou. Hoje, decorrido tanto tempo, ele se vinga dessa maneira, mostrando mais uma vez o seu caráter e sua falta de dignidade em assuntos literários.
06 de Março de 1960, p 193. Retomo a leitura de jornais e suplementos, depois de uma ausência de quinze dias. As capelas literárias continuam a funcionar como antes. Parece não haver lugar no mundo em que a literatura seja tratada tão pessoalmente, em função da pessoa dos autores, como no Rio de Janeiro. Ali se representa a maior comédia literária do país. Cidade carnavalesca, nada é levado a sério em seus domínios. Chegam a beirar o cinismo os comentários de elogio mútuo com que se mimoseiam um Franklin de Oliveira e um Otto Maria Carpeaux.
Aliás, nunca vi homem mais sujeito à paixão do que este humanista vaidoso, que se gaba de ler todos os livros de todas as literaturas. (O Tipo é bem atual)
Como é provinciano o meio literário carioca! Só aparecem ali os que fazem vida literária, os que estão exibindo suas ilustres pessoas nas rodas de livrarias e nas conversas e diz-que-zis-ques venenosos que pretendem fazer e desfazer reputações. Sinto-me feliz em viver longe de tanta mesquinhez e acanhamento mental.
A literatura não é isso, não deve ser isso. Digna de mais respeito, ela tem de seguir outros rumos, caminhos mais altos, que a literatura de panelinhas e julgamentos tão estritamente pessoais, tal como ocorre no Rio, onde se representa, sem dúvida, a maior comédia literária a que já tive ocasião de assistir.
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