Empreendo escrever a história de um pequeno número de homens que, arremessados pela Providência ao centro do maior drama dos tempos modernos, resumem em si as ideias, as paixões, as faltas, as virtudes de uma época; e cuja vida e política formando, por assim dizer, o nó da Revolução Francesa, foram cortadas pelo mesmo golpe que despedaçou os destinos de seu país.
Esta história, cheia de sangue e de lágrimas, está cheia também de ensino para os povos. Nunca talvez tão trágicos acontecimentos se passaram num espaço de tempo tão breve; nunca também esta misteriosa correlação que existe entre os atos e suas consequências se desenrolou mais rapidamente. Nunca as fraquezas engendraram mais depressa as faltas; as faltas os crimes; e os crimes o castigo. Esta justiça remuneratória que Deus colocou em nossos próprios atos como uma consciência mais santa do que a fatalidade dos antigos, nunca se manifestou com maior evidência; nunca a lei moral rendeu a si mesma um mais brilhante testemunho, e não se vingou mais implacavelmente. De sorte que a simples narração destes dois anos é o comentário mais luminoso de toda uma grande revolução; e o sangue espalhado, a ondas, não grita ali somente terror e piedade, mas lição e exemplo aos homens. É neste espirito que os narro. Lamartine, História dos Girondinos.
Pauvre France, jamais plus glorieuse.
Ele faz então um sinal aos tambores que se achavam em sua frente. Impressionados, os soldados param de bater:
"Franceses - brada o Rei com voz audível até à extremidade da praça - eu morro inocente. Perdôo aos autores de minha morte, e peço a Deus que o sangue que vai ser derramado não caia jamais sobre a França! E vós, ó povo desafortunado..." (cfr. G. Lenotre e André Castelot, Les grandes heures de la Révolution Française – La mort du Roi, p. 295).
O Rei pretende continuar sua objurgatória, mas um homem a cavalo, em uniforme da guarda nacional, desfere a espada sobre um dos tambores e força-os a cobrir a voz do Rei com o seu ruído. Nesse instante supremo, a um passo da guilhotina, os revolucionários ainda temem que as palavras do Rei comovam a multidão e todo o processo revolucionário retroceda!
Os algozes estendem o Rei sobre a plataforma, a lâmina cai pesadamente sobre a nuca de Luis XVI e sua cabeça rola pelo chão. O infame carrasco toma-a enquanto ainda gotejava sangue e dá a volta por todo o patíbulo, para que o povo inteiro tome conhecimento de que o Rei estava decapitado.
Pauvre France, jamais plus glorieuse.
Para Luís XVI, a luz do sol não brilhará mais neste mundo, a não ser no dia em que todos ressuscitarmos.
Foi no momento em que o Rei estava sendo estendido para receber o golpe fatal que, segundo algumas narrações, o Abbé Edgeworth de Firmont teria exclamado as sublimes palavras: "Filho de São Luís, subi ao Céu!"
Várias testemunhas afirmam a autenticidade dessa apóstrofe. O sacerdote irlandês, entretanto, sempre negou tê-la pronunciado. De onde se pode pensar que, ou o Abbé de Firmont fez essa exclamação movido por uma inspiração divina, e depois dela se esqueceu (fato facilmente compreensível, na emoção em que se encontrava), ou a frase foi criada por outrem a fim de exprimir - aliás de modo muito feliz - a realidade profunda desse instante histórico (cfr. Nesta H. Webster, Louis XVI and Marie Antoinette During the Revolution, Constable and Company Ltd, London, p. 524; Weiss, Historia Universal, Tipografia La Educación, Barcelona, 1931, vol. XVII, p. 98.).
Mas, em julho de 1806, ficou incapacitado com um edema. Várias operações muito penosas não conseguiram deter o progresso do mal. Fez as pazes com a Igreja oficial e, em 13 de setembro, morreu, lamentado por amigos e inimigos e até pelo rei. Foi o homem mais querido de seu tempo.
Pitt, o Moço, prematuramente velho, precedeu-o nas criptas da abadia. Também este verificou que só podia suportar o ritmo da vida política por meio da ocasional amnésia da bebida. A sanidade mental de Jorge III era um constante problema. Qualquer conflito sério de pontos de vista entre o rei e o ministro poderia desequilibrar a cabeça coroada, trazendo a regência do Príncipe de Gales, que destituíra Pitt e chamaria Fox. De forma que Pitt abandonou os planos de reforma política retirando sua oposição ao tráfico de escravos, quando viu que nestes, como em muitos outros assuntos, Jorge III era irritável e resolvido a perpetuar o passado. Pitt concentrou o seu gênio sobre a legislação econômica, no que serviu a ascensão da classe média. Muito constrangido, conduziu a Inglaterra numa guerra contra o que ele chamava uma nação de ateus. Não foi um bom ministro da guerra. Temendo a invasão da Irlanda pela França, tentou acalmar os irlandeses com um programa de união parlamentar e emancipação católica. O rei criou obstáculos e Pitt demitiu-se (1801). Voltou (1804) para chefiar o ministério. Napoleão revelou-se demais para ele, e quando chegou a notícia da vitória francesa em Austerlitz (2 de dezembro de 1805), que tornou Napoleão dono do Continente, Pitt entrou em colapso de corpo e alma. Ao ver um mapa da Europa, pediu a um amigo: Enrole este mapa, durante dez anos não vai ser necessário. Morreu em 23 de janeiro de 1806, honradamente pobre, com apenas 46 anos.
A vida levou mais tempo para destruir Sheridan. Juntou-se a Burke e Fox na defesa da América e nos ataques a Hastings. Apoiou Fox no aplauso à Revolução Francesa. Nesse meio tempo, aquela esposa cujo encanto e disposição amável eram o tema favorito entre os amigos dele, e que havia posto sua beleza a serviço das eleições para auxiliá-lo a obter um lugar no Parlamento, morreu turberculosa com 38 anos (1792).
Sheridan entrou em colapso. Eu o vi, disse uma de suas relações, chorando noite e dia como uma criança. Encontrou algum consolo na filha, mas ela morreu no mesmo ano. Durante aqueles meses de desgosto, considerou a tarefa da reconstrução do Teatro Drury Lane, que se tornara muito velho e fraco para inspirar segurança, e para financiar a reforma contraiu pesada dívida. Tinha-se habituado a uma vida de luxo, que sua renda não podia manter. Fez empréstimos para continuar naquele estilo de vida. Quando os credores chegaram, ele os tratou como lordes, entretendo com bebidas, amabilidades e graça; ao se retirarem, estavam tão satisfeitos que quase se esqueceram das dívidas. Permaneceu ativo no Parlamento até 1812, quando não conseguiu reeleger-se. Como Membro do Parlamento tinha imunidades e, portanto, não podia ser preso. Os credores fecharam o cerco em cima dele, carregando seus livros, quadros, joias. Finalmente tentaram leva-lo para a prisão, mas seu médico avisou que Sheridan podia morrer no caminho. Ele sucumbiu no dia 7 de julho de 1816, com 65 anos. No seu enterro era novamente rico, pois sete lordes e um bispo o levaram para a abadia.
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